Na soleira duma nova vida | Um Lírio sobre os Olhos
— 9 de fevereiro de 2018Pedro Belo Clara
Doira-se a linha da distância.
Não tardará o naufrágio da luz.
Com a ameaça dos grilos iminente,
de súbito clareia-se o traço
de cada contorno e forma.
A sede da noite fecunda
a silenciosa fome do dia.
Então, o que sempre foi
aos olhos se revela claro:
são meros mantos os corpos,
no longo inverno da ignorância
refúgio contra as álgidas correntes,
pano nascido do paciente gesto
dum primórdio olvidado,
lugar onde o coração encontrou
a palavra da sua trova.
No mais profundo de nós,
agora o recordamos,
tão limpo como água sem vaga,
somos flor sem pétala,
fruto sem propósito,
ave sem voo.
E todas as canções nascem de nós.
PEDRO BELO CLARA nasceu em Lisboa, Portugal. Um ocasional prelector de sessões literárias, actualmente é colaborador e colunista de diversas publicações literárias portuguesas e brasileiras. O seu último trabalho foi dado aos prelos sob a epígrafe de “Quando as Manhãs Eram Flor” (2016). É o autor dos blogues Recortes do Real, Uma Luz a Oriente e The beating of a celtic heart.
2 Comentários
Bravo!
Muito obrigado, amigo Fábio. Abraço.