DESFOLHA ANUNCIADA | Pedro Belo Clara
— 10 de novembro de 2020
Um sopro torna-se onda.
Moldada na misteriosa
sapiência de mãos cegas
entrega-se aos caminhos
com a paixão dos sedentos.
Solto esse potro louco,
em cada recanto que choca
baila na braveza de ser livre.
Ao despenhar-se na primeira dança
no vazio da rua sem cor,
as vagas agigantam-se.
De súbito, o dia mergulha
em gargantas ferozes.
Ruge inaudito um tremor
pela terra já dormente,
quase oblíqua que está
a linha do cálice celestial.
Pássaro algum arriscará
uma ária de improviso.
(Bem sabem os melros
como seria mero lamento
por uma primavera desfeita.)
Entregue a esse mar de fúria,
um velho plátano,
senhor de silêncios sem fim,
das suas folhas se despede
– com o mesmo sorriso
com que as viu nascer.
PEDRO BELO CLARA nasceu em Lisboa, Portugal. Um ocasional preletor de sessões literárias, atualmente é colaborador e colunista de diversas publicações literárias portuguesas e brasileiras. O seu último trabalho foi dado aos prelos sob a epígrafe de “Lydia” (2018). É o autor dos blogues Recortes do Real, Uma Luz a Oriente e The beating of a celtic hear.
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